Esta semana aconteceu um fato que
eu gostaria que fosse inusitado, mas não, é um fato até bem comum de acontecer,
infelizmente.
Tenho me deparado com situações
onde cada vez mais o exercício da gentileza tem causado estranheza às pessoas,
inclusive a mim. Parece que vivemos tão preso ao próprio umbigo, tão voltados
às nossas necessidades, desejos e pensamentos, que quando alguém é cortês
conosco corremos o risco de ficarmos imaginando qual é o interesse da pessoa
por trás daquele ato. Já perdi as contas de quantas feições de estranheza
presenciei diante de uma cordialidade, estranheza esta compartilhada também por
quem estava ao redor.
Vivo me questionando como viemos
parar neste ponto, onde a Lei da Vantagem, ou simplesmente, Lei de Gerson,
muitas vezes impera, onde o errado é que é o certo e que, em muitas situações,
fico constrangida por ser gentil com as pessoas, até porque "bonzinho só
se fode". Não é está a crença? Já ouvi explicações históricas,
filosóficas, psicológicas etc., mas cansei de pôr a culpa na descrença com
políticos, na crise econômica, na TPM, na pessoa que me empurra no transporte
público lotado...
Já recebi tanta gentileza de
pessoas que nem conhecia, de pessoas nas quais sou grata até hoje. Certa vez,
um rapaz que carregava no colo diversas sacolas fez questão de arrumá-las
melhor só para liberar um pouco mais de espaço e gentilmente pedir para segurar
a minha mochila. Confesso que me surpreendi.
Recentemente, li uma matéria na internet
sobre um homem que tirou suas roupas e deu para um morador de rua que passava
frio. Fiquei tocada, rapidamente repliquei na minha rede social, mas depois
passei o dia refletindo sobre o fato daquele gesto ter se tornado uma notícia.
Foi um gesto de solidariedade, de gentileza, acima de tudo, de empatia, mas me
parece que não estamos acostumados com estas amabilidades e, talvez por isto,
eu tenha me surpreendido com a oferta do rapaz em carregar a minha mochila.
Doar o lugar no ônibus a outra
pessoa, não porque ele é um assento especial, mas porque percebemos que a
pessoa está precisando mais dele do que nós naquele momento, dedicar alguns
minutos para ensinar a um novo colega de trabalho usar o sistema da empresa,
chegar atrasado a um compromisso para dar instruções a uma pessoa perdida na
rua são gestos sem heroísmos que não merecem nem devem ser notícias. Deveria
ser o lugar-comum, o cotidiano, deveria despertar não estranhezas, e sim sorrisos
imediatos.
Algumas pessoas podem achar que
esta é uma visão ingênua e romantizada, mas não há como negar a delícia que é
sentir o calor no peito quando fazemos o bem a alguém. Para mim, além de ser
uma forma de retribuir tanta bondade que já recebi durante a minha jornada de
vida, a gentileza, seja ela sucedida de estranheza ou de sorrisos, me ilumina,
me faz sentir cada vez mais que bonzinho normalmente não se fode.
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“Nenhum ato de gentileza, é desperdiçado, não importa o quão pequeno seja.” |